Dei este título porque quero escrever algo positivo neste 25 de Abril. Não sei se consigo mas vou tentar.
Este título vale, no dia de hoje, não tanto pelo meu desejo que tal se concretize ou porque seja esse o assunto desta crónica, mas mais pela celebração da minha liberdade de o escrever. É absolutamente inegável que o 25 de Abril marca o início de um processo de libertação dos portugueses das amarras das concepções perversas e curtas do que é um Estado, um País, um Povo. Mas não foi só nesse dia que se conquistou a liberdade. Em muitos dias seguintes, em 39 anos, esta foi sendo conquistada e trabalhada e vivemos hoje uma democracia.
O trabalho está longe de estar concluído. Percebemos hoje que as tentações totalitárias dos que estão no poder se mantêm e que é necessário vigiar a democracia. Percebemos hoje que a democracia é sobretudo fruto de uma educação para a liberdade. Só um povo educado em liberdade vai conseguir viver e exercer totalmente a democracia. O papel dos outros, dos que não foram educados em liberdade, será o de garantir que os mais novos o sejam.
Esta é uma questão absolutamente essencial para aqueles que, no nosso país, se sentem donos da democracia apenas porque já vestiam calças em 1974. A democracia não pertence a ninguém. Uns não são mais dignos dela do que outros. Não se reclama totalmente conquistada. Conquista-se todos os dias.
Existe em Portugal uma geração que se considera a "da democracia". Todos os anos se esforça em provar que o povo português, mais novo, raramente é digno de tão nobre e generosa oferta.
Todos os anos, nos jornais e na TV se torcem todos de alegria nervosa quando vêem um jovem ou uma criança a errar um detalhe histórico ou demonstrar desconhecimento sobre os conceitos em causa. Gemem felizes com a ignorância dos mais novos e vangloriam-se da sua consciência democrática e histórica.
É uma hipocrisia. Se os mais jovens não sabem mais é porque nós temos vergonha de falar do 25 de Abril. Guardamos um dia do ano para o assunto. Cantamos umas músicas e vendemos aquela flor. Mas não falamos de política.
Para uns o 25 de Abril é uma cena de comunistas. Ainda estão sob efeito da era Mccarthy. Para os políticos é mais um dia de discursos e oportunidade para uma aparição televisiva. Para os sindicalistas um dia de manifestações e mais uma aparição televisiva. Para a maior parte é mais um feriado e folclore.
No fundo é como o Natal. A discussão é exatamente a mesma e não vou estar para aqui a enumerar as mais do que óbvias semelhanças nos discursos sobre a natureza, significado e importância de ambas as coisas.
Isto para dizer que para mim o 25 de Abril é todos os dias (como se diz do Natal). Para dizer que a liberdade é um ar que se respira. Ás vezes aparece degradada e cheira mal, está poluída. Por isso é necessária uma proteção da liberdade e da democracia tal como se protege o meio ambiente, ou os animais. É necessário que grupos de pessoas discutam opções políticas democráticas, práticas de liberdade. E devemos olhar para isso com satisfação e não com enfado. Com interesse e não com indiferença.
Nas escolas é necessário ensinar a liberdade e com liberdade. A escola não é neutra portanto é importante que não finja uma neutralidade que não existe. Que assuma o seu papel democrático.
Temos de aceitar que mais importante do que saber coisas sobre este dia é saber como exercer a liberdade, pensar em liberdade. É mais importante saber se os nossos jovens se sentem livres e percebem a importância da democracia. Se se sentem parte do sistema democrático e defendidos dentro do sistema democrático.
A escola existe para fazer entender mas também para criar o desejo de entender, o desejo de crescer. A escola não serve para prescrever pilhas de memórias e de conteúdos.
A liberdade não se entende por um conjunto de factos históricos. Entende-se por uma prática e um exercício em conjunto. Do querer aprender e do viver essa aprendizagem.
Só pela educação se realiza o 25 de Abril. Abdicar dos valores da escola para todos é abdicar da ideia de que nascemos iguais.