Hoje, por acaso, na procura do significado de uma palavra, fui dar a um site de uma empresa de consultoria financeira e gestão e aconselhamento de investimentos. Os tempos recentes deixaram-me curioso em relação a estas empresas. À sua organização, estrutura e princípios.
Ponho-me a pensar se, há 4 ou 5 anos atrás, aconselharam ou não a comprar dívida grega ou produtos tóxicos do BPN ou outras coisas igualmente desagradáveis. Ponho-me a pensar na complexidade da tomada de decisões e na responsabilidade envolvida no aconselhamento. Tenho algum respeito pelos desafios que este trabalho implica e tenho bem a noção dos perigos e das perversões que pode implicar.
No site desta empresa em particular descubro uma área intitulada "Responsabilidade Social". Vou ler.
Fiquei de boca aberta. Então não é que os senhores doutores, mestres do investimento, do pouco e do muito risco, se preocupam com questões de responsabilidade social. Gostei.
Mas há um problema. Não estão a falar de responsabilidade nas suas funções como consultores e investidores mas sim de caridade. Afinal a empresa entrega uma parte do seu lucro, pequena suponho mas pouca diferença faz, para instituições de apoio social. Isto porque, dizem eles que os sistemas de segurança social se revelam cada vez mais incapazes de responder às necessidades da sociedade. Nada de mal aparentemente.
O problema reside exactamente no que está ausente. Um compromisso de responsabilidade social nos próprios investimentos que aconselham. Ou seja... podemos aconselhar o investimento em fundos que financiam guerras ou o trabalho escravo. Podemos aconselhar comprar dívida má contraída em situações de desespero planeado. Podemos investir em industrias poluentes ou em grupos económicos sustentados por ditaduras. Desde que pareça limpo e prometa resultados não perguntamos de onde vem nem para onde vai o dinheiro. Mas damos algum para caridade.
Enfim, investimos na criação de pobreza mas no fim pagamos a sua sopa a uns pobres.
Falta lá dizer que a empresa investe na sustentabilidade, no respeito pelo ser humano e pelo meio ambiente e que faz um rastreio ético dos seus investimentos. Isto é que é responsabilidade social. Mas ninguém quer saber disto pois não?
Como professor a minha responsabilidade social é mais do que ser bom professor mas é sobretudo ser um bom professor. Isso significa ensinar as matérias mas também orientar para a educação de valores éticos. Isso significa ter um comportamento profissional socialmente responsável. Não me chega ser um professor qualquer e depois dar uns euros por mês para a Unicef.
É por estas e por outras, por não existir uma deontologia do investidor e do mercado financeiro, que podemos estar certos que a crise não terminará. Tornar-se-á eterna. Vamos habituar-nos à condição de cidadãos menores. Os sem capital. A força trabalhadora. E vamos aceitar a caridade destes e de outros que ganham dinheiro sem querer saber se investiram na nossa desgraça. O que os levará para o céu é que nos pagaram a sopa e por isso estaremos eternamente gratos.
Não sei se esta empresa investe bem ou mal. Devemos sempre presumir que cumprem a lei e acredito que sejam bons rapazes (só homens nos órgãos sociais). O que interessa aqui é a questão teórica e de comunicação que revela uma forma particular de ver as coisas, de definir um conceito de responsabilidade. Só isso.