quinta-feira, abril 25, 2013

Hoje posso gritar "Passos para a rua!"

Dei este título porque quero escrever algo positivo neste 25 de Abril. Não sei se consigo mas vou tentar.

Este título vale, no dia de hoje, não tanto pelo meu desejo que tal se concretize ou porque seja esse o assunto desta crónica, mas mais pela celebração da minha liberdade de o escrever. É absolutamente inegável que o 25 de Abril marca o início de um processo de libertação dos portugueses das amarras das concepções perversas e curtas do que é um Estado, um País, um Povo. Mas não foi só nesse dia que se conquistou a liberdade. Em muitos dias seguintes, em 39 anos, esta foi sendo conquistada e trabalhada e vivemos hoje uma democracia.

O trabalho está longe de estar concluído. Percebemos hoje que as tentações totalitárias dos que estão no poder se mantêm e que é necessário vigiar a democracia. Percebemos hoje que a democracia é sobretudo fruto de uma educação para a liberdade. Só um povo educado em liberdade vai conseguir viver e exercer totalmente a democracia. O papel dos outros, dos que não foram educados em liberdade, será o de garantir que os mais novos o sejam.

Esta é uma questão absolutamente essencial para aqueles que, no nosso país, se sentem donos da democracia apenas porque já vestiam calças em 1974. A democracia não pertence a ninguém. Uns não são mais dignos dela do que outros. Não se reclama totalmente conquistada. Conquista-se todos os dias.

Existe em Portugal uma geração que se considera a "da democracia". Todos os anos se esforça em provar que o povo português, mais novo, raramente é digno de tão nobre e generosa oferta.

Todos os anos, nos jornais e na TV se torcem todos de alegria nervosa quando vêem um jovem ou uma criança a errar um detalhe histórico ou demonstrar desconhecimento sobre os conceitos em causa. Gemem felizes com a ignorância dos mais novos e vangloriam-se da sua consciência democrática e histórica.

É uma hipocrisia. Se os mais jovens não sabem mais é porque nós temos vergonha de falar do 25 de Abril. Guardamos um dia do ano para o assunto. Cantamos umas músicas e vendemos aquela flor. Mas não falamos de política.

Para uns o 25 de Abril é uma cena de comunistas. Ainda estão sob efeito da era Mccarthy. Para os políticos é mais um dia de discursos e oportunidade para uma aparição televisiva. Para os sindicalistas um dia de manifestações e mais uma aparição televisiva. Para a maior parte é mais um feriado e folclore.

No fundo é como o Natal. A discussão é exatamente a mesma e não vou estar para aqui a enumerar as mais do que óbvias semelhanças nos discursos sobre a natureza, significado e importância de ambas as coisas.

Isto para dizer que para mim o 25 de Abril é todos os dias (como se diz do Natal). Para dizer que a liberdade é um ar que se respira. Ás vezes aparece degradada e cheira mal, está poluída. Por isso é necessária uma proteção da liberdade e da democracia tal como se protege o meio ambiente, ou os animais. É necessário que grupos de pessoas discutam opções políticas democráticas, práticas de liberdade. E devemos olhar para isso com satisfação e não com enfado. Com interesse e não com indiferença.

Nas escolas é necessário ensinar a liberdade e com liberdade. A escola não é neutra portanto é importante que não finja uma neutralidade que não existe. Que assuma o seu papel democrático.

Temos de aceitar que mais importante do que saber coisas sobre este dia é saber como exercer a liberdade, pensar em liberdade. É mais importante saber se os nossos jovens se sentem livres e percebem a importância da democracia. Se se sentem parte do sistema democrático e defendidos dentro do sistema democrático.

A escola existe para fazer entender mas também para criar o desejo de entender, o desejo de crescer. A escola não serve para prescrever pilhas de memórias e de conteúdos.

A liberdade não se entende por um conjunto de factos históricos. Entende-se por uma prática e um exercício em conjunto. Do querer aprender e do viver essa aprendizagem.

Só pela educação se realiza o 25 de Abril. Abdicar dos valores da escola para todos é abdicar da ideia de que nascemos iguais.

 

sexta-feira, abril 19, 2013

O caso do "Excel" avariado

Tenho andado a seguir esta notícia em sites internacionais. É um caso curioso. Em 2010 Carmen Reinhart e Ken Rogoff publicaram um artigo "Growth in a time of debt". Nesse artigo, após uma extensa análise de cerca de 200 anos de dados económicos, afirmam categoricamente que o crescimento económico de um país diminuía sempre que a dívida era mais de 90% do Produto Interno Bruto (PIB).

Este artigo foi um tiro de partida para as medidas de austeridade que a Europa adoptou com tanta dedicação.

Vem-se a ver agora que os dados analisados no artigo, ou seja a folha de "Excel" usada para fazer as contas continha erros. Seria no mínimo cómico caso não tivesse consequências trágicas para milhões de trabalhadores europeus.

Vamos então ver isto por partes:

1- O conteúdo do artigo não foi inteiramente revisto por pares, como a academia exige, nem os dados citados como fonte foram publicados para serem revistos aquando da sua publicação. Só agora foi possível rever os dados. Esta crítica é generalizada. É este o grau de exigência dos economistas europeus a este nível...

2- Pessoalmente acho estranho que, com "ferramentas tão potentes" de análise de dados, se tenha recorrido ao Excel para tão importante empreitada.

3- A notícia do Público não explora a questão como deveria. Os investigadores Thomas Herndon, Michael Ash, e Robert Pollin da Universidade de Massachusetts, ao reverem os dados descobriram que Reinhart e Rogoff cometeram 3 tipos de falhas: exclusão de dados arbitrária, ponderação de dados incorreta e erros de fórmulas de calculo.

Por exemplo: No estudo, 19 anos de dívida acima dos 90% do PIB no Reino Unido com um crescimento médio de 2,6% vale tanto como um ano de dívida acima do mesmo valor na Nova Zelândia com uma retração de 7,6% da economia. Este exemplo é paradigmático.

4- Uma outra análise dos mesmos dados pode levar a concluir o contrário daquilo que afirmam os autores. Que uma retração económica pode levar a um aumento da dívida em percentagem do PIB e não o contrário. Isto é fácil de perceber, não é preciso nenhum "excel". Quando são tomadas medidas de austeridade que retiram dinheiro das carteiras das pessoas por via de quebra de salários e aumento de impostos, e simultaneamente o Estado reduz o seu investimento na economia, o dinheiro a circular diminui porque sai para o exterior em juros de dívida inflacionados, diminui a produtividade porque a procura não existe e a economia retrai-se e o PIB cai. Como os juros são insustentáveis e o pagamento da dívida é suportado por nova dívida, as medidas de austeridade vão provocar um aumento da dívida em percentagem do PIB. É o que está a acontecer em Portugal.

Por isso estamos em espiral recessiva. Acreditar em milagres ou conversas como "com sacrifício vamos ultrapassar as dificuldades" é uma treta. Só se resolve a crise com medidas políticas e económicas europeias concretas e inteligentes. A larga escala.

Os nossos sacrifícios não estão a servir para nada excepto um programa de emagrecimento dos serviços do Estado que vai deixar os mais desfavorecidos entregues a si mesmo e garantir uma prática de transferência do dinheiro dos impostos para a iniciativa privada empresarial, sobretudo o sector financeiro da economia. Teremos um páis economicamente rico mas com um povo pobre.

Quem vier dizer que é o contrário está a enganar-nos. Foi o que aconteceu na América de Bush e é o que querem que aconteça aqui.

O facto de Vítor Gaspar citar o "estudo" de Reinhart e Rogoff não é de estranhar. Os políticos liberias no poder "tratam-nos como shamans, não economistas" e vão continuar a acreditar nas suas conclusões ainda que sejam provadas erradas. Nada disto é ciêntifico e fingir que é tem consequências desastrosas.

Gaspar não é um bom técnico, é só um mau político. É preciso perder o pudor de pôr em causa estes deuses de pés de barro da ciência exacta que de exacta não tem nada.

 

quinta-feira, abril 11, 2013

Investir nas pessoas ou no dinheiro?

Do meu ponto de vista todo o dinheiro gasto, pelo Estado, em salários ou pensões tem um efeito positivo para a economia. Na verdade a classe média gasta o seu dinheiro em Portugal e o que poupa guarda-o em bancos dentro de portas. Estes trabalhadores/consumidores põem a economia e a procura interna a funcionar e permitem o crescimento.

É o principal investimento do estado na economia, é o investimento nas pessoas, deveria ser o princípio destes liberais, não o oposto. O bem estar dos cidadãos promove os índices de confiança. Uma nação optimista pode investir e avançar. Uma nação deprimida e castigada dificilmente investe no que quer que seja. São promovidos sentimentos de insegurança, desconfiança e de revolta social.

Emprestar dinheiro aos bancos para sanear as suas contas, agregar compras em contratos gigantes para empresas gigantes, concessionar serviços públicos para gerar receitas a grandes empresas (as que ganham as concessões) à base de serviços piores com salários mais baixos, aceitar as chantagens de agiotas como são o FMI ou o BCE com empréstimos com garantias ruinosas, contratar escritórios de advogados para fazer o trabalho dos deputados e dos acessores (pagos a peso de ouro), baixar os salários aos cidadãos de modo a que não gastem mais do que o absolutamente essencial (pelos vistos uma prática moral purificadora dos valores) e outras aventuras são práticas habituais do estado capitalista e conservador contemporâneo.

Assiste-se hoje a uma dependência total e absoluta do grande capital em relação aos estados para o seu financiamento e para a manutenção de negócios e contratos altamente rentáveis. Esta dependência faz-se igualmente no modo como o tráfico de influências garante um fluxo constante de legislação que desregula o comportamento incorrecto e vai garantindo ferramentas de resgate e saneamento económico quando tudo corre mal.

Passamos de ter pessoas dependentes do estado para ter bancos e corporações dependentes totalmente dos estados. Não é, com certeza, apenas o Estado Português mas é também o Estado Europeu na figura do seu banco central e da comissão europeia.

Por isso, hoje, o trabalho do Estado tem sido financiar uma economia sem pessoas (ou com muito poucas pessoas) com o dinheiro que retira às pessoas e aos organismos que garantem qualidade de vida às pessoas, como são as escolas, os hospitais ou organismos e instituições produtores e promotores de cultura.

Não aceito discursos catastrofistas que apresentem Portugal como um país sem viabilidade económica. Não aceito os discursos que dizem que para haver país temos de ser pobres e muito menos os aceito vindo daqueles que não sofrem com a crise. Ouvimos todos os dias banqueiros e grandes empresários a dizer que devemos fazer sacrifícios mas eles próprios vêem os seus lucros a aumentar com as contradições da crise. Para eles, a desgraça alheia, mais não é do que uma oportunidade de negócio. E eles próprios, como cidadãos, não fazem um único sacrifício.

A verdade é que estamos ao serviço de interesses mais altos do que nós. Interesses que põem a vida das pessoas em segundo lugar.

A única solução passa pela demissão deste governo e por eleições. Passa pela discussão alargada das soluções possíveis para a gestão desta crise. Sim, porque não há saída para a crise, pelo menos enquanto os nossos parceiros europeus acharem que a Europa se faz com os interesses só de alguns.

Deixarmo-nos levar por discursos económicos falsamente pragmáticos é abandonar a ideia de que as soluções são necessariamente políticas, como sempre foram na história, e que passam por opções estratégicas que abram oportunidades de crescimento aos mais fracos. Essa é a margem de crescimento da Europa.

quinta-feira, abril 04, 2013

A demissão de Miguel Relvas.

"Ministro Miguel Relvas pede demissão"
no site do jornal Público.

Miguel Relvas demite-se. Até que enfim! O ar está mais limpo...
Passos Coelho ainda teve menos coragem do que o próprio Relvas e esperou que este saísse nas suas próprias condições, "por vontade própria", "sem condições anímicas" mas estranhamente "como entrou". Já tinha combinado a saída e ainda assim falou de coesão do governo. É só um exemplo da falta de coerência do que habitualmente diz.
Nuno Crato, que deveria seguir o mesmo caminho, guardou o resultado da investigação até que este decidisse sair e recusou-nos ver feita a justiça feita a um ministro. Ficamos a saber que um Ministro que falha ou que mente se mantém no cargo o tempo que quer e que inclusive a justiça do Ministério da Educação espera que se demita para cumprir o seu dever. Viva a dignidade do Governo!
Relvas gaba-se do trabalho feito pela RTP e pelas autarquias que extinguiu. Também se gaba do programa "impulso jovem" com "mais de dez mil candidatos a estágios" ou por exemplo "na igualdade de género". Pois, foi o que eu pensei...
Ou seja, está a pedir-nos a equivalência a Ministro sem ter feito realmente o curso, sem ter cumprido o seu trabalho.
Uma mão cheia de nada, muitas más ideias, algumas mal intencionadas, outras inúteis, e a indignidade do cargo são as únicas coisas que Relvas nos deixou em dois anos.
Relvas deveria agora ir fazer os exames do secundário e tentar o acesso ao ensino superior público, antes que ponham em causa o seu 12º ano. Era de homem sentar-se ao lado dos que verdadeiramente se esforçam e estudam para o seu futuro.
Vamos voltar a ouvir falar de Relvas mas para mim, honestamente, é um político sem interesse mas com interesses, sem ideais mas cheio de ideias, alguém que deveria desaparecer da esfera pública para sempre.